quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O2 Filmes


Falaremos da o2 Filmes a produtora de cinema, TV e publicidade mais importante e premiada do Brasil.

Começamos pelo espaço físico da produtora, que já se diferencia bastante dos arquétipos de uma empresa comum.


Nos oito mil metros quadrados do galpão localizado na Zona Oeste de São Paulo, encontra-se um hall de entrada totalmente vazio, com apenas cinco poltronas multicoloridas, no estilo “casa da vovó”, contrastando com o imenso paredão vermelho, olhando para cima, vemos portinholas no jirau que dão acesso às salas dos diretores. Prosseguindo, mais um grande espaço, só que com mesas grandes, cadeiras e muita gente descontraída às voltas com projetos de todos os tipos.


Ninguém tem lugar marcado, não vemos ternos nem cabelos penteadinhos, e sim tatuagens. É chegar, abrir o laptop, sentar e trabalhar. Filmes, pelo jeito, não se fazem com pompa. Muito menos com paredes, escritórios engomados ou qualquer outra convenção do gênero.

A o2 Filmes, sem duvida, é uma firma fora do padrão. Fernando Meirelles é o grande chefe do império e conta que 2005 foi o pior ano de sua vida, mas também foi o ano de sua consagração como diretor de cinema no mercado internacional.

Afirma que passou aqueles 365 dias divulgando mundo a fora o filme “O Jardineiro Fiel”, emagreceu muito e ficava triste nos aeroportos, simplesmente por um cansaço extremo.


O diretor de “Cidade de Deus”, que tem o feito inédito para o cinema nacional de quatro indicações para o Oscar, decidiu, no fim da maratona, parar de filmar. Um ano depois, ele estava pronto de novo para o cinema.

Agora está trabalhando em seu próximo longa para a o2, baseado na perturbadora obra de José Saramango “Ensaio sobre a Cegueira”, que terá a equipe toda brasileira, mas um elenco todo internacional, tendo um orçamento de 50 milhões de Reais.


Apesar do crescente sucesso, o tom da o2 é mais ou menos esse, defendido por um chefe que encontrou o equilíbrio e esta em sua melhor forma.

Com dezesseis anos, a produtora nasceu da associação de Meirelles com o também diretor Paulo Morelli e a produtora executiva Andréa Barata Ribeiro. Impossível esquecer alguns clássicos da propaganda que saíram de lá para virar bordão nacional, como; “Não é nenhuma Brastemp” e “Nossos japoneses são mais criativos que os outros”.


Vale lembrar também as campanhas da Parmalat e da C&A. A moça que escolhe o elenco a dedo, se chama Cecília Homem de Melo e procura tipos tidos como bizarros para os padrões publicitários.

O estilo o2 Filmes ganhou fama, e não só em comerciais. Em 2001, Fernando lançou seu primeiro longa, “Domesticas”, daí pra frente muito se fez por ali.

A empresa tem hoje quatro braços: o2 Publicidade, o2 Cinema e TV, o2 Digital, que produz peças para novas mídias como celulares, e o2 Internacional, que viabiliza produções estrangeiras de cinema e publicidade, gravadas no Brasil.


Cada trabalho envolve a equipe fixa de quinze direto

res e oitenta funcionários, mais equipes contratadas para “jobs” específicos.


Por dia, cerca de seiscentas pessoas passam pelo galpão da o2. Tudo, no entanto, passa pela sala da mulher da casa, Andréa, que foi citada na lista das cinqüenta produtoras executivas mais importantes do mundo, divulgada pela respeitada revista norte-americana “Variety”, especializada em cinema. Chamada só de “Barata” pelos colegas, Andréa conta que o filme “Domesticas” foi lançado com apenas seis copias independentes e fez cem mil espectadores.

Eles tinham só cinqüenta mil para lançar o filme, e perceberam que era hora de fazer mais do que publicidade. Antes desse primeiro longa, a o2 já havia feito alguns curtas e ganharam prêmios, assim tomaram coragem para a nova empreitada no cinema.


A sala de Andréa fica no segundo pavimento, mas como se trata de um galpão, com vão livre que integra os espaços, ela não se isola no seu mundo de números, cálculos e planejamento, captação de verbas e claro, contas a pagar. Sua função está ligada diretamente às estr

atégias da produtora.


É preciso estar perto de tudo, e as coisas não param de acontecer. Em 2004, por exemplo, a o2 abriu uma cede no Rio de Janeiro, para dar suporte às gravações feitas na cidade. Andréa chega à empresa às 10h e 30m. A essa hora, já respondeu de casa a mais de quarenta e-mails sobre mais de quarenta assuntos, fica na o2 o dia todo, interagindo com as pessoas, seu papel é tomar decisões.


Apesar de toda a responsabilidade de sua função, Barata percebe que seu tempo ócio é sagrado, são nos momentos de total falta do que fazer que ela pens

a, elabora e tem idéias. Como o trabalho exige planejamento e estratégia, ela mantém distancia física e emocional para enxergar o todo.


A produtora é como uma turma que só aconteceporque tem um monte de pessoas remando na mesma direção.

Dois outros diretores da casa são; Heitor Dhalia e Philippe Barcinsk. O primeiro foi o responsável pelo filme “O Cheiro do Ralo” que foi lançado com somente 750 mil reais, a história é uma produção urbana que transcende qualquer limite geográfico, cultural ou regional.


O diretor é um sujeito com sotaque pernambucano carregado e empáfia característica do estereotipo dos diretores de cinema. Heitor começou como redator de publicidade e, em 2002, abandonou um salário alto e vendeu um apartamento de cobertura para filma

e “Nina”, seu primeiro longa. Na época já tinha contato com a o2, que produziu alguns de seus curtas.


Mas, só recentemente, depois do lançamento de “Cheiro do Ralo”, foi convidado para integrar o time de diretores associados com a produtora.

Já Philippe Barcinsk é um tipo mais “ow profile” Carioca radicado em São Paulo há quase duas décadas, realiza “jobs” para a o2 há dez anos. Dirigia testes de elenco

quando mostrou seu primeiro curta, “Palíndromo”, para Fernando. Desde então, faz todos os seus filmes na produtora. “A Janela Aberta”, primeiro trabalho realizado totalmente na o2, foi selecionado para a mostra competitiva oficial de Cannes.


Com cinco curtas, trinta documentários e alguns episódios de “Cidade dos Homens” no currículo, Philippe está na expectativa do lançamento do seu primeiro longa, “Não por Acaso”, que conta a história de homens racionais, cartesianos, que de repente se deparam com conflitos existenciais.

O diretor acredita que o seu contato com Fernando Meireles foi muito enriquecedor, diz que o chefe respeita a individualidade, mas também opina com humor e cordialidade. Outro ponto forte da o2 é a estrutura.


É uma produtora que oferece ao diretor a possibilidade de alavancas um filme, trabalho do alemão Hank Levine, que ocupa uma das salas do segundo pavimento. Marido de Andréa, ele entrou para o time em 2002, para dirigir a o2 Internacional.


Hank trabalhava nos Estados Unidos como produtor de cinema há onze anos e trouxe na bagagem a experiência de lidar com o mercado lá de fora. Ele viabiliza co

ntratos de co-produção, o que possibilita a utilização de benefícios, subsídios e incentivos oferecidos pelos governos dos paises envolvidos, e negocia os direitos autorais de uma obra lá fora, como fez com “Cidade de Deus” e a Miramax.


Outra tarefa dele, a que ocupa mais parte do seu tempo, é realizar toda a produção para empresas internacionais que queiram filmar no Brasil. Nesse caso a o2 planeja t

oda a vida do visitante. Ele diz que atende gente do mundo inteiro. Entre seus clientes estão nomes de peso, como, Coca-Cola, Nike, Audi, Swatch, Pepsi, Reebock e Adidas, além da galera de cinema que filma.


Com isso, Hank promove uma espécie de intercambio publicitário e cinematográfico.


Muitas agencias vem para o Brasil com o roteiro pronto e aproveita os diretores da o2 para filmar no país. Como depende do fuso horário para trabalhar, Hank costuma passar a tarde com as filhas e a noite fica pendurado no telefone.

O estrangeiro diz que negociar com a Miramax foi difícil, mas que no fim conseguiram um acordo satisfatório, afirma também, que Meirelles não acreditava em “Cidade de Deus”, que só queria recuperar intestimentos, e que ele (Hank), teria sacado o potencial do filme dês o primeiro momento.


O único departamento vinte e quatro horas da empresa é pós-produção, uma faceta da produtora que está prestes a se tornar mais um braço, liderada por Tamis

Lustre.


Tamis e sua equipe vão finalizar filmes publicitários e de cinema de outras produtoras. Já estão fazendo, mas ainda não se oficializaram oficialmente no mercado. É justamente na pós-produção que nada pode falhar, e normalmente os prazos estão todos estourados. Lá, er

ros de filmagens são acertados, cores são corrigidas, introduz-se efeito gráfico, coloca-se letreiro, sonoriza-se a peça. Enfim, tudo o que se faz num filme depois que o diretor acaba de gravar.


Nos últimos tempos, eles sofreram com a edição de “O Banheiro do Papa”, de César Charlone, um uruguaio que esta na casa há muitos anos e fez a fotografia de “Cidade de Deus”. Valeu a trabalheira, pois o filme foi selecionado para o Festival de Cannes.


Atualmente, a o2 filmes finaliza cinqüenta peças publicitárias por mês. Segundo Tamis, o que garante o bom humor no “freezer” é a equipe. A idade media da trupe é de 25 anos. O sangue novo resulta em ousadia e muito gás.

Em quinze anos a produtora fez nove longas, onze curtas, três series de TV, onde mil duzentos e dezoito campanhas publicitárias, vinte e sete mil novecentos de dezessete latas de negativos foram usados, o que corresponde a três mil trezentos e cinqüenta e um metros, a mesma distancia que vai de Ponta Porá no Mato Grosso do Sul, a Manaus na Amazônia. Três mil novecentos e sessenta e nove diárias de filmagem e cento e cinqüenta e três mil e seiscentos e noventa e sete atores testados.


Os estúdios da o2 são comparados ao Projac da toda-poderosa Rede Globo de Televisão. São três estúdios gigantescos encravados em uma área de quinze mil m

etros quadrados de floresta virgem na cidade de São Paulo.


O complexo conta com restaurante, marcenaria para a produção de cenários, departamento elétrico, vidraça, guarda-moveis, onde fica armazenada a produção de todos os filmes, acervo de figurinos e até um dormitório para os diretores exaustos repousarem após maratonas de gravação.

A o2 é a única produtora brasileira com tamanha estrutura.

A produção por ali é intensa, no seus anos de história, são sete longas (“Viva-Voz”, “Domesticas”, “Cidade de Deus”, “Contra Todos”, “Antonia”, “Não por Acaso” e “O Banheiro do Papa”). Três séries de TV (“Cidade dos Homens”, “Filhos do carnaval” e “Antonia”), e cerca de doze mil peças publicitárias.


Por trás da produção cinematográfica da o2 esta Bel Berlink, a mulher que controla desde o numero de garrafinhas de água que se consomem no set, até o cachê dos atores. O tempo para se botar uma obra na rua é curto: cerca de sete semanas de pré-produção, mais sete semanas de filmagem e aproximadamente oito meses de pós-produção.

Para cada projeto uma equipe é contratada. O papel de Bel é colocar limites nas loucuras dos diretores. É tudo predeterminado e todo mundo tem que se enquadrar.

Será este o começo de um verdadeiro mercado para o cinema nacional? Isso só o tempo nos dirá.

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